Sexta, 31 de março de 2017

(Sb 2,1.12-22; Sl 33[34]; Jo 7,1-2.10.25-30) 
4ª Semana da Quaresma.

A perseguição sofrida por Cristo já era protagonizada pelo justo no Antigo Testamento: “Se de fato, o justo é ‘filho de Deus’, Deus o defenderá e o livrará das mãos dos seus inimigos. Vamos pô-lo à prova com ofensas e torturas, para ver a sua serenidade e provar sua paciência; vamos condená-lo a morte vergonhosa, porque, de acordo com suas palavras, virá alguém em seu socorro” (Sb 2,18-20), a descrição não podia ser melhor ao que nos propõe os evangelhos. Mas a paixão de Cristo transcendeu esse simples retrato deixando-se matar sem que um socorro imediato lhe ocorresse. Ocorreu sua confiança em Deus, em meio as suas tribulações: “Do coração atribulado ele está perto e conforta o espírito abatido. Muitos males se abatem sobre o justo, mas o Senhor de todos eles os liberta” (cf. Sl 33[34]). Deus pode não responder do modo exato que pensamos ou desejamos, mas nunca deixa de responder, para Jesus seu silêncio foi inquietante, mas suficiente para saber que não estava sozinho e em suas mãos podia entregar o seu espírito.


 Pe. João Bosco Vieira Leite

Quinta, 30 de março de 2017

(Ex 32,7-14; Sl 105[106]; Jo 5,31-47) 
4ª Semana da Quaresma.

Os judeus tinham suas razões para esperar na palavra de Moisés, pois no passado, como quem fala com um amigo, ele intercedeu a Deus pelo povo que está adorando outras divindades, esquecidos do seu Deus, mal saíram do Egito pela mão poderosa do Senhor. Eles estão para cometer o mesmo erro ao rejeitar o próprio Jesus que lhes fala, fiando-se mais na leitura literal das Escrituras, sem compreender a salvação que lhes é oferecida: “Não penseis que eu vos acusarei diante do Pai. Há alguém que vos acusa: Moisés, no qual colocais vossa esperança. Se acreditásseis em Moisés, também acreditaríeis em mim, pois foi a respeito de mim que ele escreveu” (Jo 5,45-46). A narrativa do bezerro de ouro traz consigo o perigo da idolatria que nos ronda com a falta de memória de quem é o nosso Deus: um Deus misericordioso, mas ciumento do que é seu. Onde estou, com quem estou exatamente nesse processo de caminhada na fé?


 Pe. João Bosco Vieira Leite

Quarta, 29 de março de 2017

(Is 49,8-15; Sl 144[145]; Jo 5,17-30) 
4ª semana da Quaresma.

“... para dizer aos que estão presos: ‘Saí!’ e aos que estão nas trevas: ‘Mostrai-vos’” (Is 49,9). Começando por um discurso que fala da própria vocação. Sua missão é trazer de volta a Jerusalém o povo exilado, por isso o convite para liberdade e para a luz. Lendo esse convite na perspectiva quaresmal poderíamos nos perguntar o que nesse momento me ‘prende’ ou me condiciona não permitindo uma relação mais próxima com Deus. Do que sou convidado a me libertar? Há muitas ‘prisões’ de que não nos damos conta, muitas que entramos por contra própria e que podem parecer até bobagem. É sob a luz da Palavra que procuramos fazer esse caminho quaresmal, na verdade do próprio Jesus: “Em verdade, em verdade vos digo, quem ouve a minha palavra e crê naquele que me enviou possui a vida eterna. Não será condenado, pois já passou da morte para a vida” (Jo 5,24). Páscoa é um processo de passagem, recordamos na noite da vigília ao lermos a travessia do mar vermelho. Em que margem estamos? Em que margem queremos estar? No meio do mar não podemos ficar.


 Pe. João Bosco Vieira Leite

Terça, 28 de março de 2017

(Ez 47,1-9.12; Sl 45[46]; Jo 5,1-16) 
4ª Semana da Quaresma.

O profeta Ezequiel tem uma visão estupenda que aponta para o futuro do povo de Deus, na renovação do Templo e de Jerusalém: “O anjo fez-me voltar até a entrada do templo e eis que saia água da sua parte subterrânea” (Ez 47,1). Com essa imagem da água vemos Jesus se aproximar da piscina de Betesda. Lá há um homem doente que deseja banhar-se dessas águas para alcançar a cura.  Eis que a verdadeira água dele se aproxima, a mesma que a samaritana experimentou, e lhe propõe também beber dessa água que é a fé em seu santo nome, que ele ainda não conhece bem, mas conhecerá quando Ele for levantado da terra e de seu lado aberto jorrar sangue e água, para lavar toda culpa e encher nossa vida de sentido.

Pe. João Bosco Vieira Leite


Segunda, 27 de março de 2017

(Is 65,17-21; Sl 29[30]; Jo 4,43-54) 
4ª semana da Quaresma.

Eis que criarei novos céus e nova terra, coisas passadas serão esquecidas, não voltarão mais à memória” (Is 65,17), essa é a proposta do Senhor ao manifestar a nós a sua misericórdia. O tempo da quaresma nos oferece a possibilidade de refletir, de pedir perdão e recomeçar: “Escutai-me, Senhor Deus, tende piedade! Sede, Senhor, o meu abrigo protetor! Transformastes o meu pranto em uma festa, Senhor meu Deus, eternamente hei de louvar-vos!” (cf. Sl 29[30]). Aproximemo-nos d’Ele como este funcionário real, cheio de confianças que o Senhor é capaz de curar. A experiência do perdão provoca grande alegria, vivida no contexto pascal das celebrações desse período.  


 Pe. João Bosco Vieira Leite

4º Domingo da Quaresma - Ano A

(1Sm 16,1b.6-7.10-13a; Ef 5,8-14; Jo 9,1-41)

1. A Bíblia é um livro que testemunha de modo insistente, que os critérios do agir divino não têm nada a ver com o nosso. Na busca de entender a Deus devemos nos deixar conduzir pela luz da fé e pela confiança. Assim podemos ler esse trecho de Samuel sobre a escolha de Davi, futuro rei de Israel, que vai na contra mão das escolhas comuns. O olhar de Deus vai numa outra perspectiva.  

2. Se “as aparências enganam aos que odeiam e aos que amam”, o homem de fé sabe que seus passos e seus dias estão sob o olhar e a condução de Deus. Reza o nosso salmo.

3. Luz e treva sempre nos serviram de comparação entre o bem e o mal, vida e morte. Assim Paulo recorda aos que foram iluminados por Cristo, como devem andar. Mas Paulo acrescenta uma ação que é resultado de uma consciência bem formada: denunciar as obras das trevas. Esses últimos tempos em nossa sociedade sabemos bem o que isso significa. Um misto de incertezas nos acompanham, mas estamos enxergando um pouco melhor nossa própria realidade e convidados a decidirmos o que queremos daqui pra frente.

4. Quem se decidiu pela vida cristã sabe que existe um itinerário de fé pela frente. Ver, a partir da fé, coloca de modo evidente certas situações e atitudes que são obscuras ao nosso redor. Acompanhando a trajetória desse cego do evangelho podemos acolher a luz que nos traz o evangelista João.

5. As limitações humanas não são castigos divinos, esclarece Jesus aos seus discípulos. Esse não é o Deus que ele lhes revelou. Deus intervém na vida do cego recuperando lhe a vista, que quando passa a vê, torna-se alguém estranho aos seus compatriotas. A fé deve provocar mudanças significativas.

6. Como na primeira leitura, muitos estão convencidos que Deus só pode agir dessa maneira, que a bondade ou a maldade das pessoas ou coisas estão bem definidas a partir de nós mesmos. Como os pais dos cegos, nem sempre nos comprometemos com a verdade por medo de perder algo.

7. Acompanhando as atitudes do que foi curado percebemos sua liberdade diante dos que lhe rodeiam; não se deixa intimidar nem de apresentar a verdade dos fatos. Mas permanece aberto em sua busca de compreender o que lhe aconteceu. João traça um perfil de quem se deixou iluminar por Cristo e por sua Palavra.

8. Jesus está no começo e no fim da narrativa. Ele dá sentindo a esses dois pontos da nossa caminhada, veremos mais claramente no próximo domingo. Por enquanto resta perceber que para chegar a reconhecer a Jesus como Senhor de nossa vida e aceita-lo na fé, é preciso avaliar o quanto a sua luz tem envolvido a nossa existência e feito diferença. Esse mesmo mistério da luz será revivido em nossa celebração da vigília pascal.

 Pe. João Bosco Vieira Leite 

Sábado, 25 de março de 2017

(Is 7,10-14; 8,10; Sl 39[40]; Hb 10,4-10; Lc 1,26-38) 
Anunciação do Senhor.

Outra pausa em nossa quaresma essa semana. Olhamos para trás, por um instante, para recordar o momento em que Jesus entra de modo definitivo em nossa história. Para selar os nove meses da gestação de Jesus, entre as negativas que Deus foi recebendo do seu povo para empreender um caminho de salvação, Jesus e Maria se unem para dizer sim à vontade de Deus. Mãe e Filho se unem num projeto comum de levar a frente o projeto do Pai, na alegria e na dor, seguem juntos esses dois corações até o momento da Cruz, que sela toda entrega para a salvação do mundo. A liturgia nos convida a perceber essa maravilhosa semelhança entre as palavras de Maria: “Eis aqui a serva do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra” (Lc 1,38) e as de Jesus ao entrar no mundo: “Eu vim para fazer a tua vontade” (Hb 10,9). Deus nos pede muito e nos promete muito mais, assim Maria responde sim na alegria e na fé Àquele que é capaz de fazer maravilha, pois grande é o Seu nome

Pe. João Bosco Vieira Leite

Sexta, 24 de março de 2017

(Os 14,2-10; Sl 80[81]; Mc 12,28-34) 
3ª Semana da Quaresma.

Ao Senhor que tem cuidado de todos os seus passos, Israel é convidado a retornar. “Compreenda estas palavras o homem sábio, reflita sobre elas o bom entendedor!” (Os 14,10). Da reflexão do salmista brota essa oração que dá voz ao desejo do próprio Deus: “Quem me dera que meu povo me escutasse! Que Israel andasse sempre em meus caminhos!” (cf. Sl 80[81]). Ao escriba que lhe pergunta sobre o mandamento mais importante, Jesus responde lembrando a primeira atitude que confere importância ao que será dito: “Ouve, ó Israel!”. Somos todos devedores dessa escuta. Só ela nos permite compreender a dinâmica desse amor a Deus que atravessa o amor ao próximo como se fosse um único mandamento.


 Pe. João Bosco Vieira Leite

Quinta, 23 de março de 2017

(Jr 7,23-28; Sl 94[95]; Lc 11,14-23)
3ª Semana da Quaresma.

Jeremias reclama da incapacidade do povo de ouvir a palavra do Senhor: “Mas eles não ouviram e não prestaram atenção; ao contrário, seguindo as más inclinações do coração, andaram para trás e não para frente...” (Jr 7,24). O salmo 94 complementa essa incapacidade fazendo memória daquele episódio do deserto que escutamos nesse domingo: “Não fecheis os corações como em Meriba, como em Massa, no deserto, aquele dia em que outrora vossos pais me provocaram, apesar de terem visto as minhas obras”. Além de não escutar se reclama de Deus. A escuta predispõe para a fé e a confiança. A falta de escuta nos faz perder a globalidade dos fatos da vida e perceber o quanto Deus tem caminhado e se envolvido com a nossa existência. Assim, alguns que vêm Jesus expulsar demônios, mas não escutaram suas palavras nem conhecem as suas obras são capazes de destorcer o sentido de sua ação. Cuidado com a tentação da ‘leitura’ isolada dos acontecimentos. Ela carrega consigo um sentimento de ingratidão, de não reconhecimento.


 Pe. João Bosco Vieira Leite

Quarta, 22 de março de 2017

(Dt 4,1.5-9; Sl 147[147B]; Mt 5,17-19) 
3ª Semana da Quaresma.

“Vós os guardareis, pois, e os poreis em prática, porque neles está vossa sabedoria e inteligência perante os povos,...” (Dt 4,6). Moisés proclama uma segunda vez a lei que Deus havia dado ao seu povo, nela se encontra a luz que dá ao povo um modo diferenciado de proceder, mas esse deixar-se conduzir pela lei do Senhor vem também de tudo que o povo já experimentou ao longo do caminho, há uma obediência que nasce da certeza de que Deus quer o nosso bem, não a lei pela lei. Lido assim, o texto do evangelho, fora do seu contexto mais amplo, parece uma simples defesa da lei, mas Jesus veio mostrar que ela pode ser vivida de um modo mais amplo e não literalmente, obrigando-nos a pensar sobre seu conteúdo. “Anuncia a Jacó sua palavra, seus preceitos e suas leis a Israel. Nenhum povo recebeu tanto carinho, a nenhum outro revelou os seus preceitos” (cf. Sl 147).


 Pe. João Bosco Vieira Leite

Terça, 21 de março de 2017

(Dn 3, 25.34-43; Sl 24[25]; Mt 18,21-35) 
3ª Semana da Quaresma.

“De agora em diante, queremos, de todo coração, seguir-te, temer-te, buscar tua face, não nos deixes confundidos, mas trata-nos segundo a tua clemência e segundo a tua imensa misericórdia” (Dn 3,41-42). Azarias reza, em meio às chamas, já experimentando a misericórdia e a grandeza da ação divina e se comprometendo em responder à altura do benefício recebido. Assim Pedro é levado a compreender que o perdão que oferecemos tem sua raiz no perdão que já recebemos de Deus, tantas vezes, revelando sua paciência para conosco. A parábola lança um juízo sobre a nossa ação sem misericórdia. “Mostrai-me, ó Senhor, vossos caminhos e fazei-me conhecer a vossa estrada! Vossa verdade me oriente e me conduza, porque sois o Deus da minha salvação” (cf. Sl 24[25]).


Pe. João Bosco Vieira Leite

Segunda, 20 de março de 2017

(2Sm 7,4-5.12-14.16; Sl 88[89]; Rm 4,13.16-18.22; Mt 1,16.18-21.24) 
São José.

A importância dos domingos quaresmais não permite que o mesmo seja substituído por qualquer festa ou solenidade que coincida com esse dia, por isso a transferência dessa solenidade para o dia de hoje. Nesses textos entrecortados da nossa aparece a importância de José no contexto geral da história da salvação. Ele vem da tribo de Davi e assim a sua linhagem acolherá o Messias, o seu filho adotivo, a verdadeira casa a ser construída para Deus é o seu Reino que Jesus veio revelar e que José também acolheu em sua atitude de silenciosa obediência. Assim a fé de José é exaltada nesse texto paulino em que se destaca a figura de Abraão. É quase um jogo de comparação: como Abraão, acreditou e tronou-se pai de uma multidão, José, que também acreditou, também aparece como pai de um povo, consequência da pregação do filho, e age a partir não da lei, mas da justiça que vem da fé. Tudo que o passado antecipava e o futuro confirmava, se vislumbra nesse hoje do evangelho que se proclama sobre o sim de José associado ao de Maria. Convidando-nos também a não ter medo e a confiar nas promessas divinas. Sim, louvado seja São José e louvado sejam todo homem e mulher que têm aceitado o desafio de viver da fé, conduzido pelo Espírito “porque dissestes: ‘O amor é garantido para sempre!’ E a vossa lealdade é tão firme como os céus” (cf. Sl 88[89].


Pe. João Bosco Vieira Leite

3º Domingo da Quaresma – Ano A

(Ex 17,3-7; Sl 94[95]; Rm 5,1-2.5-8; Jo 4,5-42).

1. Os dois primeiros domingos da quaresma insistem na força da palavra de Deus e da escuta de Jesus para vencer toda tentação. Mensagem que se repete a cada ano. Mas o ano de Mateus traz à tona os elementos batismais; depois da escuta da palavra temos a bênção da água para o batismo. Em torno dessa realidade batismal gira a nossa liturgia da palavra.

2. O cristão que recebeu o batismo poderia pensar que todas as dificuldades foram deixadas para trás, que o caminho a sua frente seria de felicidade. Mas não é bem assim. Esse trecho da travessia do deserto e a sede do povo que nos é proposto como primeira leitura lança luzes sobre essa realidade. Ali há um lamento por causa da saída do Egito.

3. A dúvida sobre a fidelidade divina atravessou o coração do povo, como atravessa o nosso vez ou outra. A tentação de por Deus à prova é uma constante. As dificuldades enfrentadas, a comparação da nossa vida com a de outros que não estão nem aí para a vivência religiosa põe em ‘cheque’ a escolha que fizemos. Deus sabe de tudo isso e vem em nosso auxílio.

4. Paulo fala de uma esperança que não decepciona e que tem por base o amor de Deus por nós ao nos entregar seu filho quando ainda éramos pecadores. Assim Paulo fala da bondade de Deus e não perdermos a confiança mesmo reconhecendo nossas limitações. Deus é sempre mais.

5. O elemento água, que mata a nossa sede, serve de base para a nossa compreensão de outras sedes que carregamos ao longo da vida. Tanto quanto de outro alimento.

6. Uma mulher samaritana tem a sorte de encontrar-se a sós com Jesus. O texto nos deixa entrever todo um contexto de preconceitos entre judeu/samaritano, homem/mulher. Também brinca com elementos simbólicos muito fortes do Antigo Testamento: o poço como local de encontro da história de Israel e da relação amorosa e conflituosa entre Deus e o seu povo.

7. Nesse quadro geral compreendemos que Jesus é aquele que vem ao encontro do seu povo como um esposo atrás de sua amada infiel. Daí compreendemos tantas informações nessa narrativa.

8. Mas Jesus vai pouco a pouco conduzindo o diálogo para uma compreensão que a nossa felicidade não está tão somente nessa busca material das coisas da vida. A mulher que é despertada a partir de dentro, vai compreendendo paulatinamente quem é este que conversa com ela. Uma espécie de caminho espiritual que todos fazemos pela fé.

9. Mateus já havia nos dito que a vida é bem mais que a veste, que a comida ou bebida. Há um outro alimento que é necessário para a vida: a fé. É dela que tiramos forças para seguir adiante em meio aos desafios da vida e dela damos testemunho a quem ainda não entendeu o que significa viver da fé.

10. É diante dessa proposta que os adultos que se preparam para o batismo se aproximam dessa água, elemento material, para banhar-se do Espírito de Deus que ela simboliza e que jorra para sempre. A nossa liturgia nos prepara para a vigília pascal, ela trará de volta esse elemento, para que renovemos a nossa fé, o nosso batismo, e experimentemos novamente a graça restauradora que Jesus oferece.


 Pe. João Bosco Vieira Leite

Sábado, 18 de março de 2017

(Mq 7,14-15.18-20; Sl 102[103]; Lc 15,1-3.11-32) 
2ª semana da Quaresma.

“Qual Deus existe, como tu, que apagas a iniquidade e esquece os pecados daqueles que são resto de tua propriedade?” (Mq 7,18). A experiência da misericórdia divina já era experimentada pelo povo de um modo geral. Jesus amplia essa experiência da misericórdia divina quando envolve em seu convívio os pecadores de sua época ou ao menos assim identificados. Ao contar a parábola do Pai misericordioso Jesus não só redimensiona o amor de Deus para com cada um dos seus filhos, mas deixa claro que todos nós somos devedores desse amor e que somos todos, em maior ou menor escala, pecadores. Isso quer diminuir nossa ‘raiva’ em direção ao outro e nos faz repensar a nossa relação com Deus: “Não fica sempre repetindo as suas queixas nem guarda eternamente o seu rancor. Não nos trata como exigem nossas faltas nem nos pune em proporção às nossas culpas” (Sl 103,9-10).




Pe. João Bosco Vieira Leite

Sexta, 17 de março de 2017

(Gn 37,3-4.12-13.17-28; Sl 104[105]; Mt 21,33-43.45-46) 
2ª Semana da Quaresma.

“Aí vem o sonhador! Vamos matá-lo e lançá-lo numa cisterna...” (Gn 37,19). Em alguns momentos a história de José se torna um pequeno tratado sobre o ciúme e até onde esse sentimento pode nos levar na rejeição pelo outro. A história é lida a partir da rejeição de Jesus por parte das autoridades de seu tempo, onde o zelo religioso disfarça o ciúme daquele que traz um pouco de luz e alegria à vida de pessoas comuns. O final pode parecer trágico, mas a ação de Deus dá outro rumo a certas ações humanas, conclui os dois textos. Há certos fracassos aparentes aos olhos humanos que somente Deus pode nos oferecer a interpretação ou a finalidade que desconhecemos. Diz o ditado que Deus escreve certo por linhas tortas. Talvez esteja aqui a interpretação do texto sagrado. O salmo nos lembra como Deus agiu em favor do seu povo em todo o processo do chegar e sair do Egito a partir de situações contraditórias, para não perdermos a esperança. 
  
Pe. João Bosco Vieira Leite


Quinta, 16 de março de 2017

(Jr 17,5-10; Sl 01; Lc 16,19-31) 
2ª Semana da Quaresma.

“Maldito o homem que confia no homem e faz consistir sua força na carne humana, enquanto o seu coração se afasta do Senhor;” (Jr 17,5). Nessa assustadora afirmação de Jeremias está não a prática da confiança em si, mas no que afasta o nosso coração de Deus. Uma amizade pode nos levar a terreno ou estilo de vida que desconhecemos, deixando de lado a experiência da Palavra ou dos antepassados. O salmo 01 cai como uma luva na interpretação do profeta e da própria liturgia ao nos oferecer o texto de Lázaro pobre e do rico indiferente. A riqueza ou outras formas de sobrevivência podem nos fechar o coração e cegar nossa visão de mundo e das realidades, colocando a nossa segurança em coisas, bens e pessoas que são contingentes. Para toda a nossa existência, em altos e baixos, só Deus não passa nem faltará ao final do caminho, seja de modo positivo no auxílio necessário, seja de modo negativo, no juízo que pesa sobre a nossa existência. “Pois Deus vigia o caminho dos eleitos, mas a estrada dos malvados leva à morte” (Sl 1,6).
  
Pe. João Bosco Vieira Leite


Quarta, 15 de março de 2017

(Jr 18,18-20; Sl 30[31]; Mt 20,17-28) 
2ª Semana da Quaresma.

“Acaso pode-se retribuir o bem com o mal? Pois eles cavaram uma cova para mim” (Jr 18,20). É o Jeremias perseguido que lança luzes sobre a paixão que Cristo irá sofrer por mãos dos sumos sacerdotes e mestres da lei, “Eles o condenarão à morte e o entregarão aos pagãos para zombarem dele, para flagelá-lo e crucificá-lo” (Mt 20,17-28); o pedido da mãe dos filhos de Zebedeu fica em segundo plano, ainda que tanta insensibilidade por parte dos discípulos seja gritante. De qualquer modo, seja na paixão de Jeremias ou de Jesus a fé nos faz provar, em graus diversos a rejeição por parte de alguns, ainda que tenhamos praticado o bem para com este. Há algo de misterioso nessa erva daninha que cresce no coração humano e o faz ir contra o semelhante, ainda que este não lhe tenha feito nenhum mal. Mas há um princípio que não podemos esquecer: o bem que me fazem traz à luz minha incapacidade de fazer o mesmo. Minha reação pode ser positiva ou negativa. “Em vossas mãos, Senhor, entrego meu espírito, porque vós me salvareis, ó Deus fiel! ” (Sl 31,6).
  

Pe. João Bosco Vieira Leite

Terça, 14 de março de 2017

(Is 1,10.16-20; Sl 49[50]; Mt 23,1-12) 
2ª Semana da Quaresma.

“Lavai-vos, purificai-vos. Tirai a maldade de vossas ações de minha frente...” (Is 1,16). A liturgia combina dois textos que tratam da relação entre culto e justiça. O profeta os considera inúteis quando não se busca praticar o bem. Por isso Jesus convida a observar como agem os mestres do seu tempo, mesmo considerando que eles tenham a capacidade de bem interpretar a lei: “Mas não imiteis suas ações! Pois eles falam e não praticam” (Mt 23,3). Jesus considera uma injustiça cobrar dos outros o que nem mesmo nós conseguimos fazer. “A todo homem que procede retamente eu mostrarei a salvação que vem de Deus” (Sl 50,24).


Pe. João Bosco Vieira Leite

Segunda, 13 de março de 2017

(Dn 9,4-10; Sl 78[79]; Lc 6,36-38) 
2ª Semana da Quaresma.

“...mas a ti, Senhor, nosso Deus cabe misericórdia e perdão,...” (Dn 9,9). Apesar de reconhecer os seus pecados, o povo reza na esperança de que Deus possa perceber a insensatez humana e agir de uma outra forma para como o seu povo. Sim, Deus pode agir diferente, mas nós seriamos capazes de agir de outra forma que não seja aquela pautada pelo julgamento e pela condenação? Toda ação gera uma reação. Quem experimentou a misericórdia divina deveria agir também com misericórdia. “Ajudai-nos, nosso Deus e salvador! Por vosso nome e vossa glória, libertai-nos!” (Sl 79,9).


Pe. João Bosco Vieira Leite

2º Domingo da Quaresma – Ano A

(Gn 14,1-4; Sl 32[33]; 2Tm 1,8b-10; Mt 17,1-9)

1. Desde sempre Deus caminhou com a humanidade, mas lhe aprouve manifestar-se a homem chamado Abrão, convidando-o a aventura da fé. Dele virá o futuro Israel. Dito assim tudo parece muito bonito e poético, mas na realidade algumas situações políticas e econômicas o obrigam a deixar sua terra. Ele lê, nesses fatos, um novo caminho a partir da fé em Deus.

2. Esse texto tem a ver com os adultos que estão se preparando para receber o batismo, nesse Ano da Quaresma em nossa liturgia. Também eles são chamados a viver um caminho de fé, tendo que deixar para trás muitas coisas. O caminho de Abrão é o modelo do caminho de todos quantos vivem a dimensão e o desejo de responder ao chamado de Deus. Se deixa muito, mas é muito mais o que Deus promete.

3. Milhares de anos depois, um outro homem vive também o drama da fé. É para ele que escreve Paulo. Já bispo de Éfeso, Timóteo enfrenta, juntamente com as comunidades, as dificuldades de um cristianismo que avança em meio às perseguições.  Mas Paulo centra seu discurso na vocação cristã como um dom, em Cristo Jesus.

4. É para o mesmo difícil caminho da fé que Jesus quer preparar seus discípulos. Para isso, leva-os a uma montanha e lá se transfigura. Transfigurar-se seria mudar a forma ou feições. Na realidade Jesus queria deixar transparecer a divindade escondida em sua frágil humanidade.

5. Estamos de novo sobre um monte. Há detalhes na narrativa de Mateus que nos remete a experiência de Moises quando subiu ao monte para receber os dez mandamentos. Entendemos uma vez mais sua insistência em apresentar Jesus como um novo Moisés. Tudo fala da presença de Deus que envolve Jesus, como no Batismo: o Filho amado, escolhido.

6. A presença de Moisés e Elias que ladeiam Jesus deixa clara a nova orientação que Deus dá ao seu povo. Pedro supõe que tudo seja igual, mas a voz orienta a quem devem escutar a partir de então. Moisés e Elias desaparecem, já cumpriram sua missão. Todo o seu ministério, no mistério da fé, caminhava para esse momento.

7. Aqueles que estavam se preparando para o batismo deveriam tomar por guia o próprio Jesus na doação da própria vida. Desde Abrão até hoje continuamos a escutar o convite de Deus a sairmos de nossa terra, das coisas a quem nos prendemos para abraçar o caminho da fé.

8. Nunca saberemos exatamente o que nos espera ao longo do caminho. Sabemos apenas que é preciso andar. Para quem anda é necessário um guia, uma luz, um itinerário. Jesus é essa proposta de Deus para os homens e mulheres de todos os tempos. Ele mesmo é a terra prometida que esperamos, na paz que experimentamos, na comunhão com Deus que buscamos. 


Pe. João Bosco Vieira Leite


Sábado, 11 de março de 2017

(Dt 26,16-19; Sl 118[119]; Mt 5,43-48) 
1ª Semana da Quaresma.

“E o Senhor te escolheu, hoje, para que sejas para ele um povo particular, como te prometeu, a fim de observares todos os seus mandamentos” (Dt 26,18). O povo resolve acolher os mandamentos divinos e Deus os acolhe para que seja um povo particular, mas essa particularidade se reflete na consciência de que o preceito divino os faz pensar e agir diferente. Assim, nesse trecho do sermão da montanha que nos oferece o evangelho, Jesus propõe reler o mandamento divino de uma forma mais ampla, fazendo da oração pelos inimigos uma fonte de libertação pessoal, uma luz que se acende internamente e se reflete no agir cristão. “Feliz o homem que observa seus preceitos e de todo o coração procura Deus” (Sl 119,2).  


Pe. João Bosco Vieira Leite


Sexta, 10 de março de 2017

(Ez 18,21-28; Sl 129[130]; Mt 5,20-26) 
1ª Semana da Quaresma.

“Se levardes em conta nossas faltas, quem haverá de subsistir? Mas em vós se encontra o perdão, eu vos temo e em vós espero” (Sl 130,3-4). Este salmo penitencial reúne em si delicada sensibilidade, simplicidade e sinceridade de linguagem e a mais profunda percepção da natureza do pecado e da graça. O salmo constitui a confissão de fé de um homem piedoso, a quem foi dado erguer-se da mais profunda angústia pelo pecado até a certeza da graça e do perdão divinos. “Como a criança que apanhou evita o olhar do pai, ele não ousa expressar imediatamente o pedido pelo perdão dos pecados, pois sente fortemente quão pouco lhe assiste o direito, por causa de sua situação, para esse tipo de pedido. Só depende da decisão de Deus se quer ou não perdoar. [...] À pergunta ‘se levardes em conta as nossas faltas, quem haverá de subsistir? ’ subjaz o reconhecimento oprimente do gigantesco poder do pecado e da paralisante impotência do homem que nele caiu. Está entregue nas mãos divinas para a graça e a desgraça, e diante de Deus não é possível esconder o verdadeiro estado do homem. Mas – eis o que é maravilhoso – o conhecimento da natureza do pecado perante Deus ao mesmo tempo abre os olhos para ver a grandeza da divina graça” (Artur Weiser, “Os Salmos” – Paulus)


 Pe. João Bosco Vieira Leite

Quinta, 09 de março de 2017

(Est 4,17; Sl 137[138]; Mt 7,7-12) 
1ª Semana da Quaresma.

“Senhor, eu ouvi, dos livros dos meus antepassados, que tu libertas, Senhor, até o fim, todos os que te são caros” (Est 4,17aa). É com essa experiência do passado que Ester se dirige a Deus na esperança de alcançar ajuda para se colocar diante do rei e pedir a salvação do seu povo. E ela consegue, faz o que deve fazer, não espera tão somente que as coisas aconteçam, confiando em Deus fez o seu caminho. Deus deseja na oração essa abertura de coração e confiança. Assim Jesus pode também recomendar aos seus discípulos a arte de rezar com perseverança e com a certeza de que Deus dará o que for necessário. A quaresma como tempo propício a oração nos lembra a arte da confiança e da perseverança. “Eu agradeço vosso amor, vossa verdade, porque fizeste muito mais que prometestes; naquele dia em que gritei, vós me escutastes e aumentaste o vigo da minha alma” (Sl 138,2-3).


 Pe. João Bosco Vieira Leite

Quarta, 08 de março de 2017

(Jn 3,1-10; Sl 50[51]; Lc 11,29-32) 
1ª Semana da Quaresma.

“Vendo Deus as suas obras de conversão e que os ninivitas se afastavam do mau caminho, compadeceu-se e suspendeu o mal que tinha ameaçado fazer-lhes e não fez” (Jn 3,10). Esse texto de Jonas retoma a aquela questão já levantada por Abraão quando intercedia por Sodoma. Deus é capaz de mudar os seus planos, sendo Ele imutável? O que move o coração de Deus a mudanças significativas é a própria mudança do ser humano em seu proceder. Deus muda à medida que mudamos, porque aceita esperar por nós. Deus nos dá o tempo necessário para a conversão. Há sempre um Jonas passando por nossa rua, se prestarmos atenção. “Ó Senhor, não me afasteis de vossa face nem retirei de mim o vosso santo espírito” (Sl 51,13).  


 Pe. João Bosco Vieira Leite

Terça, 07 de março de 2017

(Is 55,10-11; Sl 33[34]; Mt 6,7-15) 
1ª Semana da Quaresma.

“...A palavra que sair da minha boca não voltará para mim vazia...” (Is 55,11). A liturgia de hoje joga com duas palavras; uma divina, que desce, que é fecunda e a seu tempo dará seu fruto. Mateus trata de uma palavra humana, que sobe, em forma de oração. Concisa e consciente do esforço que deve fazer para que essa palavra se concretize no exercício da confiança e da busca de viver de acordo com a palavra que vem do alto, que ainda aguarda se fazer vida em nós. Ela voltará a Deus, um dia, transformada em ação e prece, fecundada pelo Espírito de Deus na abertura do coração humano. “Comigo engradecei ao Senhor Deus, exaltemos todos junto o seu nome!” (Sl 34,4). 


Pe. João Bosco Vieira Leite

Segunda, 06 de março de 2017

(Lv 19,1-2.11-18; Sl 18[19]; Mt 25,31-46) 
1ª Semana da Quaresma.

“Fala a toda a comunidade dos filhos de Israel e dize-lhes: Sede santos, porque eu, o Senhor vosso Deus, sou santo” (Lv 19,2).   A santidade exigida de Deus para o seu povo não tinha só a ver com o sentido de separação dos outros povos, mas de uma ação concreta em favor do outro, seu próximo. Assim, a questão não estava na escolha em si, mas de um povo que se deixou transformar pelas indicações divinas e se tornou luz para os outros povos. O evangelho complementa a nossa reflexão trazendo a imagem do juízo final na compreensão da mensagem de Jesus da prática do bem, sem olhar a quem e sem intenção de ‘aparecer’ ou parecer ser bom. A luz do evangelho alcança a quem desconhecemos. Que a luz da palavra de Deus ilumine nossos passos nesse período quaresmal guiando-os para bem a ser feito. “A lei do Senhor Deus é perfeita, conforto para a alma!” (Sl 19,8).


 Pe. João Bosco Vieira Leite

1º Domingo da Quaresma – Ano A

(Gn 2,7-9; 3,1-7; Rm 5,12-19; Mt 4,1-11)

1. Para ilustrar as tentações sofridas por Jesus ao longo do seu ministério a liturgia nos traz essa narrativa de Mateus que as condensa em três aspectos. Mas a liturgia também nos diz que o ser humano vem sendo tentado desde sempre, por isso introduz essa narrativa do Gênesis, que traz um ensinamento religioso importante.

2. Essa narrativa de caráter simbólico lembra ao leitor que há um limite que não deve ser ultrapassado. Somente Deus pode nos dizer o que é o bem e o que é o mal. Nossa condição de criatura gera confusão nas escolhas a serem feitas, ligadas muitas vezes às paixões que nos regem, facilmente tomamos por bem o que é mal.

3. A serpente é a ilustração da sutileza, do silêncio de como certas coisas sorrateiramente entram em nossa vida e podem gerar a morte. Vende-se a falsa ideia de que Deus não quer o homem plenamente livre e feliz. Nossa maior tentação é perder a confiança em Deus, não mais se deixar conduzir por ele, por sua palavra. Estar nu é envergonhar-se de si, descer ao nível mais baixo. Só os animais irracionais andam nus.

4. Esse denso texto de Paulo que se segue nos coloca diante do mistério redentor de Cristo e da graça divina. Contrapondo os dois personagens, Paulo avalia as consequências da escolha de Adão. Cristo faz um caminho oposto. Segue na obediência e no acolhimento da palavra do Pai traz ao mundo a superabundância da Graça, maior que os pecados humanos. Cristo é o modelo a ser seguido.

5. Cristo, na sua condição humana experimentou a tentação de deixar de lado o projeto de Deus, na esteira de todos os grandes personagens bíblicos. Mateus quis dar plasticidade a uma situação que Cristo sofreu internamente. Ele nos oferece essas três cenas onde a história de Israel também aparece na sua travessia pelo deserto.

6. Israel lamentou, ao longo do caminho, do pão que Deus lhes havia concedido, a ponto de ter saudade do Egito, da terra da escravidão e da abundância. O diabo tenta Jesus no servir-se de seu poder para criar a abundância, o ‘ter’ aparece como caminho de felicidade. Jesus deixa claro que quem não se alimenta da palavra divina, pode até ‘ter’, mas não será feliz. Não é com essa ideia de felicidade que lidamos todos os dias?

7. Por vezes a nossa fé se parece com a do povo no deserto, testando a Deus para ver se ele era realmente fiel à sua aliança. Jesus se recusa a tal papel, uma vez que ele confiou no Pai, ele seguirá até o fim. Não necessita de provas do seu amor, aprendeu a confiar. Assim também somos tentados a desconfiar do amor de Deus se não nos concede as coisas exatamente como queremos.

8. Outra grande tentação que nos rodeia é aquela com relação ao poder. Julgamos ser a chave de tudo, mas sabemos até de modo prático o que nos custou a ditadura do poder de alguns. Jesus compreende que Deus é uma outra forma de poder que orienta o ser humano para uma vida plena de sentido, capaz de humildemente servir. Só ele merece adoração.

9. É assim que Mateus provoca a sua comunidade a refletir sobre as escolhas que estão fazendo, se elas estão sob a luz de Deus, assim como fez Jesus. Assim é a quaresma, uma proposta de reflexão e revisão.


Pe. João Bosco Vieira Leite


Sábado, 04 de março de 2017

(Is 58,9-14; Sl 85[86]; Lc 5,27-32) 
Depois das Cinzas.

“Se destruíres teus instrumentos de opressão e deixares os hábitos autoritários e a linguagem maldosa; se acolheres de coração aberto o indigente e prestardes todo socorro ao necessitado, nascerá nas trevas a tua luz e tua vida obscura será como o meio-dia” (Is 9-10). A quaresma nos convida a uma séria revisão de vida seja no campo pessoal quanto social. A Palavra pede muito a quem tem conseguido tão pouco, mas perseguimos, sob a luz dessa mesma palavra saciar essa ‘sede na aridez da vida’ para dar sentido ao nosso esforço ao longo do caminho. Não é fácil deixar que a luz de Deus transpareça em nossa vida. Mateus resolveu fazer uma última refeição junto aos seus antigos companheiros para empreender um novo caminho. Nenhuma decisão que tomarmos nesse projeto de mudança/resposta no caminho da conversão deve ser feita de modo triste ou pesaroso: “Animai e alegrai vosso servo, pois a vós eu elevo a minha alma” (Sl 86, 4).



Pe. João Bosco Vieira Leite

Sexta, 03 de março de 2017

(Is 58,1-9; Sl 50[51]; Mt 9,14-15) 
Depois das Cinzas.

“Acaso o jejum que prefiro não é outro: quebrar as cadeias injustas, desligar as amarras do jugo, tornar livres os que estão detidos, enfim, romper todo tipo de sujeição?” (Is 58,6). Desde sempre vivemos essa ‘briga’ de compreendermos bem o que significa jejuar e seu real valor. Talvez o autor sagrado aqui o tome na dimensão de sacrifício oferecido a Deus. Assim entendido, que sacrifício seria maior que sair de nós mesmos para nos envolvermos com as situações (e pessoas) que nos cercam? O jejum serve também como exercício de autodomínio e reeducação de pontos que em nós precisam voltar aos eixos. Mas tudo isso deve ser praticado em clima de oração, pois precisamos de uma luz que guie o nosso agir e de uma graça especial para sermos pessoas um pouco melhores. Não se desespere, nem se inquiete se as coisas ainda não mudaram de forma significativa. Leva-se  uma vida para mudar um coração: “Meu sacrifício é minha alma penitente, não desprezeis um coração arrependido!” (Sl 50,19).


Pe. João Bosco Vieira Leite

Quinta, 02 de março de 2017

(Dt 30,15-20; Sl 01; Lc 9,22-25) 
Depois das cinzas.

“Vê que hoje eu te proponho a vida e a felicidade, a morte e a desgraça” (Dt 30,15). Ao nos propor uma escolha, por que a vida é uma escolha contínua, o autor sagrado nos diz que a proposta de Deus não pode ser confundida. O contraste apresentado não podia ser menos impactante. Certamente fala a pessoas que tem uma consciência formada sobre essa realidade. E isso não é impossível de ser alcançado ou ao menos compreendido. Vivemos como Adão e Eva, no risco contínuo de perdermos o paraíso. A árvore do bem e do mal continua plantada ao nosso redor. Nossas escolhas dependem de um coração voltado para Deus. Esse tempo nos convida a voltar-nos um pouco mais sobre a palavra divina, retomarmos o nosso caminho sob a sua luz: “Feliz é todo aquele que não anda conforme os conselhos dos perversos; que não entra no caminho dos malvados nem junto aos zombadores vai sentar-se; mas encontra seu prazer na lei de Deus e a medita, dia e noite sem cessar” (Sl 1, 1-2).


 Pe. João Bosco Vieira Leite

Quarta, 01 de março de 2017

(Jl 2,12-18; Sl 50[51]; 2Cor 5,20—6,2; Mt 6,1-6.16-18) 
Cinzas.

1. Nestes domingos que antecederam a quaresma, estávamos acompanhando o sermão da montanha, e assim, nesse ano A (Mateus), podemos dar uma sequência a nossa reflexão, a partir desse texto do evangelho que se repete todos os anos para dar o tom de nossa piedade quaresmal. São três instruções precedidas de uma advertência: a falsa prática da “justiça”; não praticar as obras de piedade para serem vistos pelas pessoas. Parece contradizer o convite a deixar que a nossa luz brilhe diante dos homens.

2. É uma contradição aparente, porque a ideia de recompensa que buscamos é essa entrada na comunhão de vida com Deus. Deus não recompensa um a um os resultados obtidos, mas concede a cada um que a ele se entregou – não importa em que tempo – a recompensa plena. Ele mesmo é a recompensa indivisa, que se oferece a todo aquele que acolhe sua oferta gratuita e a ela responde por meio de ações. Se agimos para ser vistos, elogiados, já não temos nada para receber de Deus.

3. Numa sociedade obcecada por resultados, que tudo procura quantificar, aparece algo que não se pode quantificar: o amor com que realizamos certos gestos. O Deus paternal vê no segredo, conhece nosso coração melhor que nós próprios. Um amor que, também diante de Deus, não leva em conta a si mesmo, experimenta como recompensa o amor de Deus: o amor parecido ao de Jesus.

4. A oração constitui a instrução central do sermão da montanha. Aqui temos uma pequena introdução que culminará no Pai nosso. Salienta-se seu aspecto privado e de petição, muito cara a mentalidade judaica. Censura-se a hipocrisia que faz da oração uma demonstração na qual a pessoa exibe-se a outras pessoas, em vez de dirigir-se a Deus somente.

5. Se a publicidade é buscada conscientemente ou não, existe sempre o perigo de desconhecer a verdadeira essência da oração. O quarto é apenas uma metáfora para o âmbito do qual todas as demais pessoas são excluídas e onde o ser humano encontra-se completamente para si e com o seu Deus e Pai. É no segredo, no escondido da existência que Deus vai se manifestando, e a percepção é sempre ‘desafiantemente’ pessoal. Um convite a levar a sério Deus como Deus e a ele somente dedicar toda honra e adoração, e agradecer-lhe por sua imensa glória.

6. A advertência contra um comportamento equívoco durante o jejum diz respeito, mais uma vez, aos hipócritas que, sem sabedoria alguma, colocam a própria honra no lugar da honra de Deus. Jejuar é mais que uma renúncia à comida e bebida. O jejum diz respeito também a bens espirituais, tais como a obsequiosa e oportuna renúncia ao uso da superioridade intelectual, das vantagens profissionais ou de ocasiões de sucesso em favor de colegas malsucedidos etc. Tal jejum é um múltiplo treino no único necessário. É a sempre renovada tentativa de se entregar, a fim de poder cair nas mãos de Deus.

7. Como em todos os últimos anos aqui no Brasil, a Quaresma nos faz encontrar a Campanha da Fraternidade (CF). Este ano, mais uma vez, a preocupação se volta para a realidade ecológica:“Biomas Brasileiros e Defesa da Vida”. Ainda estamos sob os ecos da Laudato Si’ do Papa Francisco, tema que estudamos no ano anterior. O desafio da convivência com os biomas, embora não seja tema tratado especificamente no documento papal, se ilumina de modo particular com a reflexão a respeito da interligação de todas as criaturas.

8. Ele convida a renovar o diálogo sobre os sofrimentos que afligem os pobres e a devastação do meio ambiente, com cada pessoa que no planeta habita. Ele afirma que Deus deu-nos de presente um exuberante jardim, mas estamos a transformá-lo em uma poluída vastidão de ruínas, desertos e lixo. Ele nos alerta para não nos redermos ou ficarmos indiferentes perante a perda da biodiversidade e a destruição dos ecossistemas, muitas vezes provocadas pelos nossos comportamentos irresponsáveis e egoístas.

9. Dentro desse espírito quaresmal de conversão, debruçamo-nos sobre nossas riquezas e problemas. A conversão que devemos a Deus, devemos também aos irmãos e irmãs e à Sua criação. Essa realidade não diminui o espírito quaresmal. Ilumina-nos o texto do Gênesis, compreendendo a missão do ser humano de ‘cultivar e guardar a criação’ (Gn 2,15). Nosso país é famoso por sua biodiversidade e cada vez mais tem se tornado evidente nossa incapacidade de conviver com essa realidade, de preserva-la. Permanece o desequilíbrio entre economia e ecologia. 


 Pe. João Bosco Vieira Leite