Segunda, 29 de fevereiro de 2016


(2Rs 5,1-15; Sl 41[42]; Lc 4,24-30) 
3ª Semana da Quaresma.

Os dois textos que hoje nos oferece a liturgia mechem com os “brios” de Israel. Certos e seguros desse amor de Deus por eles, achavam-se no direito de somente eles receberem os benefícios divinos. No entanto, Deus age de forma sempre nova, livre e inesperada. Para nós a interpretação é clara: para receber os dons de Deus devemos reconhecer que não temos nenhum direito sobre Ele e devemos docilmente aceitar o Seu modo de agir.

Jesus é rejeitado pelos seus concidadãos porque não há neles abertura à iniciativa divina, Ele não pode fazer ali milagres, pois as graças de Deus são soberanamente livres no modo de responder as expectativas humanas. Também Naamã é convidado a rever o seu modo de ver as coisas ou do agir divino. É certo que o acolhimento feito à sua pessoa não é de primeira, mas é como se fosse um exercício de humildade que este deveria ter para experimentar o que Deus poderia fazer. De forma simples Deus é capaz de realizar grandes coisas, aprenderá Naamã e nós com ele. Peçamos ao Senhor a profunda docilidade que nos faz aderir, no nosso dia a dia, à sua ação, com simplicidade e confiança.




Pe. João Bosco Vieira Leite

3º Domingo da Quaresma – Ano C


(Ex 3,1-8a.13-15; Sl 102[103]; 1Cor 10,1-6.10.12; Lc 13,1-9)

1. A história de Moisés tem um lugar especial na história do povo de Deus. É uma vocação que vai amadurecendo ao longo de uma existência. Salvo das águas, e mesmo criado no palácio do faraó, sabia a que povo pertencia; ver seu povo escravo o levou a matar para defender, e a fugir para sobreviver.

2. É do meio de toda essa experiência que enfim, Deus se revela a Moisés e lhe dá as diretrizes do caminho que deve seguir: Ele era como uma chama que nunca se extinguiu do seu coração. A narrativa é teologicamente densa, pois também trata do modo como Deus se revela: a sarça que queima sem se consumir, o modo de estar na presença de Deus, o nome de Deus.

3. O “Eu sou” de Deus mantém a sua atualidade no presente, sem desconectá-lo do passado ou do futuro. Para hoje, ontem e amanhã, como Deus se revela? Para Moisés, Ele sempre foi o Libertador, aquele que se identificava com os anseios do seu coração. Ao longo da Bíblia ele será descoberto como Pai, mãe, esposo, rei, pastor, guia, aliado...

4. Esse ano somos chamados a descobri-lo sob o manto da misericórdia com que nos envolve em seu amor. Para sermos misericordiosos como Ele. Cada experiência de Deus que fazemos está relacionada como aquilo que devemos ser também para os outros. Moisés também foi chamado de libertador.

5. Na esteira da experiência de Moisés, Paulo cita o evento do êxodo e da caminhada no deserto e como muitos acabaram por não entrar na terra prometida. É possível perder-se no caminho, não entender bem quem é Deus. Paulo lê cada elemento do êxodo sob o simbolismo cristão e adverte do risco de não entendermos exatamente o que Jesus Cristo nos propõe.

6. Essa falta de compreensão das coisas pode nos fazer perplexos com a vida como aqueles que vão anunciar a Jesus as últimas “manchetes”. Que fazer quando nos sentimos saturados de tantas situações injustas? Desabafamos e daí? Será que algum gesto mais drástico ou violento poderia resolver? A palavra de Jesus quer nos oferecer algumas pistas.

7. Para a mentalidade da época, não existe castigo sem culpa; certamente tratava-se de pecadores... a menção a Pilatos talvez arrancasse da boca de Jesus um posicionamento político. Jesus não perde a serenidade nem pronuncia palavras imprudentes. Não relaciona tais mortes aos pecados dessas pessoas. Acrescenta mais um fato e convida a reflexão.

8. Muitas pessoas são vítimas de fatalidades, poderia ser qualquer um, diz Jesus, mas esses fatos podem ser lidos a partir da necessidade de conversão que a vida nos sugere. Ele não está fugindo do assunto, apenas conduz o olhar dos seus ouvintes para uma realidade maior e melhor que a simples murmuração ou a violência a uma estrutura opressora que desde Pilatos se vem mantendo em muitos lugares.

9. A mudança de mentalidade é a única esperança de que depois de Pilatos, é possível um governante melhor. Que a violência não é a melhor saída. Que Deus não está punindo ninguém; que desastres acontecem, mas Deus não é indiferente ao que nos acontece, que de um mal poderá tirar algo bom.

10. Que Deus é paciente, nos revela a parábola da figueira, mas não podemos adiar continuamente as mudanças necessárias em nossa vida. A liturgia da quaresma quer nos dizer que esse é um tempo favorável para empreendermos um caminho de conversão. Para que não morramos do mesmo jeito, sem ter tentado ou buscado sermos melhores.


Pe. João Bosco Vieira Leite


Sábado, 27 de fevereiro de 2016


(Mq 7,14-15.18-20; Sl 102[103]; Lc 15,1-3.11-32) 
2ª Semana da Quaresma.

O profeta Miqueias expressa o desejo de retornar aos cuidados divinos reconhecendo o Seu amor e a Sua misericórdia manifestada no perdão e no esquecimento das antigas faltas. Nesse ano da misericórdia o papa nos lembra que nos basta o impulso e o desejo na direção de Deus para experimentarmos o seu amor. A declaração de nossas culpas é um reconhecimento de que o pecado atinge não somente a mim, mas também aqueles que me rodeiam, de uma forma ou de outra. Deus é a nosso favor, nunca contra nós.

Como entender tudo isso? Jesus nos tenta convencer contando a parábola do Filho pródigo ou do pai bondoso. Assim é Deus, sempre esperando o nosso retorno e ansioso por nos envolver em seu abraço e restituir a dignidade de filhos. Nossa mudança de atitude é o melhor presente que lhe oferecemos, é como quem recebe algo de precioso. O filho mais velho não entende, envolto numa relação calculada com o pai, não lhe permite e nem se permite, amar somente, compadecer-se pela indigência do outro. Uma parábola sem um final muito claro gera uma angústia no leitor, pois lhe cobra sempre, a partir de si, um final para o que foi narrado, um posicionamento que define uma relação, uma vida, uma festa eterna.



Pe. João Bosco Vieira Leite

Sexta, 26 de fevereiro de 2016


(Gn 37,3-4.12-13.17-28; Sl 104[105]; Mt 21,33-43.45-46)
2ª Semana da Quaresma.

Outro protótipo da paixão de Cristo aparece na figura de José, vendido pelos irmãos, por inveja de ser tão amado pelo pai e ainda traz o apelido pejorativo de “sonhador”. Olhemos, rapidamente, parte por parte. Sim, Jesus é o filho amado, predileto, a quem devemos escutar. O sonho de Deus, de um mundo curado e libertado é personificado na ação e na pregação de Jesus. As autoridades religiosas do tempo de Jesus são incapazes de admitir que Deus se manifesta particularmente nele, porque sentem inveja da sua fama em meio ao povo e porque as críticas de Jesus de uma religião presa a detalhes e normas, mas pouco amorosa, lhes atinge em cheio. A que situação pode nos levar tais sentimentos repulsivos?

A resposta está na parábola que Jesus conta no evangelho. Acabaram por matar o Filho para tomar posse de sua herança. Não, Deus não age por impulso, não “vinga” a morte do Filho, mas a oferece como redenção, sem deixar que seu sonho morra. Esse mundo existe por pura misericórdia. Em cada geração cristã o sonho de Jesus sobrevive e se manifesta de maneira nova a partir de novos desafios. Buscar viver a dinâmica do Reino, ainda que pareça pequeno e insignificante a minha contribuição, é permitir que o “sonhador” sobreviva em nós. Que bom, que tens coragem de sonhar...



Pe. João Bosco Vieira Leite

Quinta, 25 de fevereiro de 2016


(Jr 17,5-10; Sl 01; Lc 16,19-31) 
2ª Semana da Quaresma.

Jeremias canta o seu lamento de ter confiado no ser humano e a resposta recebida, como vimos no texto de ontem. Sua decepção o lança num olhar mais confiante de quem é Deus para ele e como vivem aqueles que nele depositam a sua confiança. Uma imagem poética: uma árvore próxima das águas, cujas raízes buscam a umidade (“Quem tiver sede venha a mim e beba...”) e nela encontra as forças para suportar as intempéries e dar frutos no tempo devido. O primeiro salmo bíblico se inspira nesse texto e canta a escolha ou não de seguir os caminhos do Senhor.

Assim podemos ler o texto do pobre Lázaro e do rico. O grande problema do texto recai sobre o rico, não tanto em Lázaro; não sabemos se ele era um homem justo ou piedoso, só sabemos de sua miserável condição (aqui podemos entender esse posicionamento divino, independente das virtudes, com relação aos pobres sofredores). Se o rico fosse alguém que observasse as leis divinas, teria consciência da partilha necessária com aquele pobre, quem sabe de suas sobras. Podemos “passar batido” pela vida se não escutamos a palavra divina. É ela que evita que a nossa existência seja um desastre. Nem sempre somos necessariamente perversos, como diz o salmo, mas somos responsáveis sempre pelas escolhas que fazemos, até mesmo pela indiferença...  



Pe. João Bosco Vieira Leite

Quarta, 24 de fevereiro de 2016


(Jr 18,18-20; Sl 30[31]; Mt 20,17-28) 
2ª Semana da Quaresma.

É bonito e interessante esse texto de Jeremias que nos introduz no mistério da paixão de Cristo. Ele é alvo de uma conspiração maldosa daqueles por quem o próprio profeta intercedeu. Um retrato conciso do processo da paixão onde Jesus também orou ao Pai diante do sofrimento que dele se aproximava. Talvez nos questionemos se é lícito rezar ao Senhor por certos eventos que acontecem na nossa vida, uma vez que ele tudo sabe e tudo permite para daí tirar um bem maior. Sim, é lícito. Nem sempre compreendemos exatamente se a vontade de Deus está se cumprido ali ou algum capricho pessoal fez levantar-se aquela situação. Tudo em nossa vida deve ser apresentado ao Senhor, angústias, aflições, alegrias e êxitos, tudo deve estar sob Seu olhar. Um filho tudo partilha para perceber as ressonâncias do coração do pai.

No espírito da 1ª leitura, Jesus comunica aos seus discípulos o que lhe vai acontecer. A mãe dos filhos de Zebedeu não entendeu bem do que Jesus estava falando, mas antecipa-lhe que o cálice de que Jesus irá provar chegará também para eles de alguma forma, basta que sejam verdadeiramente seus discípulos. Quando somos de fato discípulos de Jesus, a sua paixão atravessa a nossa estrada em algum momento. Os outros discípulos viram nesse pedido da mãe a busca de privilégio; Jesus esclarece que o verdadeiro privilégio é poder servir, doando a própria vida, como Ele mesmo fez.

Orar é também contrapor nossos planos aos planos divinos e ir percebendo como se casa a minha intenção de realização na vida com a minha fé.


Pe. João Bosco Vieira Leite






Terça, 23 de fevereiro de 2016


(Is 1,10.16-20; Sl 49[50]; Mt 23,1-12) 
2ª Semana da Quaresma.

Se nesse domingo a tônica da palavra recaía sobre a atitude da escuta, o texto de Isaias convida a uma atitude semelhante, mas de caráter de forte conversão. O próprio Senhor se dispõe a transformar a nossa vida e espera de nós uma atitude desejosa de sua ação. São as ações que empreenderemos que deixarão clara a mudança de vida que buscamos.

São das ações dos mestres da lei e dos fariseus que Jesus chama a atenção dos seus discípulos. Elas não correspondem ao que ensinam. É preciso sempre tomar cuidado para não exigir do outro o que nem mesmo nós aprendemos a viver. As crianças sempre nos surpreendem em nossas contradições, pois querendo aprender de maneira correta, nos observam. É claro que não somos perfeitos. Não podemos viver sob a tensão de estarmos sendo observados, mas Jesus acredita que quando fazemos o que é correto e coerente com o que acreditamos, isso se torna natural em nossa vida. Desaparece a tensão e a preocupação com o que os outros vão pensar, afinal de contas queremos é viver na presença de Deus. Isso fez com que Jesus suportasse toda crítica à sua pessoa.


Pe. João Bosco Vieira Leite

Segunda, 22 de fevereiro de 2016


(1Pd 5,1-4; Sl 22[23]; Mt 16,13-19) 
Cátedra de São Pedro.

A Igreja celebra a cátedra do apóstolo São Pedro em Roma. A cátedra, isto é, o trono do sumo pontífice, constitui o símbolo da autoridade do papa e do seu magistério ordinário. Com a festa deste dia, unificam-se ambas festividades referentes às “duas cátedras” de Pedro – a de Antioquia e a de Roma – e recorda-se a investidura, feita por Cristo, de Pedro como cabeça da Igreja.

A liturgia da palavra se desenvolve a partir dessa presença, inspiração e cuidado de Deus que a tudo conduz. Cuidar do povo de Deus, lembra Pedro na 1ª leitura, como o Cristo fez em seu pastoreio, para entrega-lo ao Grande Pastor do rebanho, Deus mesmo. Foi Deus que inspirou a Pedro essa compreensão de quem é Jesus, o próprio Jesus o afirma. É de Deus que nos vem tudo o que é bom; sua graça age em nós de forma sobrenatural levando-nos a compreensão de coisas que nesse movimento comum da vida jamais perceberíamos. Acolhamos, pois essa paternidade e essa inspiração que nos leva a uma compreensão sempre maior da vida e da pessoa de Cristo.

 Pe. João Bosco Vieira Leite

2º domingo da Quaresma – Ano C


(Gn 15,5-12.17-18; Sl 26[27]; Fl 3,14—4,1; Lc 9,28b-36).

1. Vários temas atravessam a nossa liturgia da Palavra desse 2º domingo quaresmal. O tema da oração como encontro da experiência do sagrado, do inexplicável por Abraão e pelos discípulos na montanha.
* O tema da perseverança no caminho muitas vezes difícil da vida de fé, como o foi para Abraão e para os discípulos, caminharam como se visse o invisível. No convite de Paulo aos filipenses em continuarem firmes na fé.

2. A fé de Abraão é colocada aqui em destaque na 1ª leitura. Um texto quase poético; Deus o convida a sonhar não só com a terra que busca, mas com uma grande descendência.
* Abraão acredita em Deus e em resposta Deus estabelece com ele uma aliança através de um antigo rito. O texto quer salientar a gratuidade de Deus que não exige nada do homem: apenas que seja fiel, que acredite, que persevere.
* A promessa de Deus é continuar nos amando, mesmo quando os nossos erros parecerem maiores que o nosso desejo de acertar. A resposta da fé é fundamental.

3. Paulo convida os filipenses a perseverança porque sabe que a comunidade vive a constante tentação do estilo de vida dos que não abraçaram a fé.
* Paulo pede a capacidade de lançar um olhar para além, para o próprio mistério da ressurreição do homem em Cristo. Esse mesmo mistério cujo véu levantou-se por um instante para Pedro, João e Tiago.

4. O texto traz uma carga teológica na sua elaboração. Primeiro nos indica a motivação dessa subida: orar. Foi o caminho percorrido por Cristo para entender e acolher a vontade de Deus na sua vida.
* Se assim não fosse, toda a desordem do processo da Paixão que atravessaria pareceria algo sem sentido e cruel.

5. Lucas não fala de transfiguração, mas de “mudança de aparência”. Como se a experiência de Jesus na oração o tenha levado a uma espécie de transformação do ser.
* vez ou outra o encontro de oração pessoal ou mesmo comunitário pela escuta da Palavra e pela experiência simbólica, pode mexer conosco e dar-nos um pouco mais de clareza do caminho que devemos seguir. Toda subida exige algum esforço.

6. Tanto Lucas como os outros evangelistas trazem a presença do Antigo Testamento através de Moisés e Elias numa clara afirmação de que em Jesus, toda a sagrada escritura ganha sentido.
* Por outro lado se afirma que Jesus encontrou na Palavra a força não só para vencer as tentações, mas para seguir adiante. Só Lucas afirma que eles conversavam sobre o que lhe iria acontecer.

7. Os discípulos sempre aparecem em suas reações como pouco entendedores do que acontecerá a Jesus, de sua paixão.
* A interpretação mais comum dessa ideia das tendas sugeridas por Pedro é a de permanecer ali, nessa agradável situação distante de todas as dificuldades que às vezes experimentamos individual ou comunitariamente.

8. Jesus propõe não parar, mas seguir o caminho. Mesmo experimentando a montanha, vez ou outra, ainda somos seres da planície. Constantemente puxados para baixo.
* De qualquer forma, ou outros elementos que aparecem no texto são indicadores de uma experiência de Deus, onde lhes fica claro o convite a ouvir e a seguir a Jesus.

9. Os discípulos que passaram por essa experiência, naquele momento não tinham como partilhar o que nem eles mesmos entenderam.
* Nós já fazemos um caminho na fé, experimentamos a montanha e a planície, e mesmo considerando absurda a proposta de Jesus, sabemos que nela se esconde uma vida mais plena seja aqui ou depois.

10. Viemos aqui para renovar a nossa fé, pedir forças para seguir o caminho, sem esquecermos que sempre podemos partilhar com os outros um pouco da nossa experiência pessoal e dos dons que Deus nos concedeu, até o dia em que também faremos nossa passagem e formos também transfigurados.



Pe. João Bosco Vieira Leite




Sábado, 20 de fevereiro de 2016


(Dt 26,16-19; Sl 118[119]; Mt 5,43-48) 
1ª Semana da Quaresma.

É interessante a relação que os dois textos fazem com o tema da escolha divina e também nossa. Moisés recorda ao povo a obrigação de viver a aliança a partir da observação dos mandamentos. Tal vivência, por sua vez, fará deste povo algo especial, ilustre, pela santidade emanada da vivência de tais preceitos. Assim Jesus propõe uma vivência “superior” dos cristãos com relação a antiga lei, porque é o amor que determinará o novo modo de viver as relações. Tudo isso levará a um comportamento “perfeito” no sentido de que estamos nos “obrigando” a sermos melhores a partir da proposta de Jesus. Quaresma é um caminho de aperfeiçoamento do que já melhorou para algo ainda melhor. Quem caminha sabe que não pode se acomodar, se não corre o risco de nunca chegar...



Pe. João Bosco Vieira Leite



Sexta, 19 de fevereiro de 2016


(Ez 18,21-28; Sl 129[130]; Mt 5,20-26) 
1ª Semana da Quaresma.

Esse texto de Ezequiel que aparece como 1ª leitura não é de fácil “digestão” porque parece lançar uma certa nuvem sobre a misericórdia divina com relação ao justo que comete uma falta ou segue os caminhos dos ímpios, o profeta diz que o que ele foi ou fez no passado (positivamente) será esquecido.  Talvez devamos tomar em conta como uma chamada de atenção para que o justo nunca se desvie do seu caminho. A ideia central é aquela de que o pecado leva à morte, que aqui pode ser tomado no sentido físico, mas também espiritual.

Assim Jesus pode exortar os seus discípulos a uma justiça maior, evitando todo tipo de comodismo que nos dê por satisfeito ou “em dias” diante de Deus. Talvez os dois textos funcionem melhor para nós como motivadores no sentido de uma vigilância contínua e avanço no caminho da vivência da palavra. A busca da reconciliação é apenas um dos aspectos de nossa vivência e busca de viver na presença do Senhor; por outro lado os dois textos fazem um apelo para que não protelemos as coisas.

Pe. João Bosco Vieira Leite


Quinta, 18 de fevereiro de 2016


(Est 4,17; Sl 137[138]; Mt 7,7-12) 
1ª Semana da Quaresma.
                                              
Você certamente estranhará que o texto de Ester que aqui aparece como 1ª leitura com um único versículo seja tão grande. Na verdade, o livro é uma junção de sua versão hebraica e grega; este trecho que acompanhamos foi escrito em grego, por isso essa diferenciação para alertar o leitor mais curioso. O mais importante aqui é a sua oração ou o modo como expressão a sua aflição diante de Deus numa significativa abertura de coração que não mede palavras para desafogar o que sente e o que precisa. A quaresma insiste conosco nessa espontaneidade que deveria fazer parte do nosso orar.

A oração exige espontaneidade, diz Jesus, com uma certa dose de busca e insistência, mas acima de tudo de confiança e certeza d’Aquele com quem estamos falando. Jesus apela para as imagens que temos de nossas relações mais próximas de confiança: o pai e a mãe. Humanamente falando são limitados ou “maus” por causa do pecado que os envolve, mas mesmo assim são capazes de atos generosos. Deus, que nos ama infinitamente, no qual não há limitações há de nos fazer o melhor que seu coração percebeu nos diálogos que com Ele travamos. E acrescenta que o bem que fazemos aos outros deve estar em sintonia, não interesseira, de consciência do valor que dou ao outro a partir de mim mesmo.



Pe. João Bosco Vieira Leite

Quarta, 17 de fevereiro de 2016


(Jn 3,1-10; Sl 50[51]; Lc 11,29-32) 
1ª Semana da Quaresma.

O livro de Jonas é cheio de sutilezas com relação ao chamado, à resistência, à compreensão da misericórdia divina, mas no contexto da quaresma (“ainda quarenta dias”; cobrir-se de cinzas, afastar-se do mau caminho) o que conta é a força da palavra de Deus, capaz de convencer à conversão. Se bem verdade que aqui ela vem com o peso da ameaça divina. Mas só o deixar-se convencer que existe um Deus de quem a nossa existência depende já é um passo significativo no processo de aproximação e reconciliação.

O evangelho também faz uma menção a Jonas no sentido que esse pequeno profeta foi acolhido pelos habitantes de Nínive que acreditaram em sua palavra. Jesus, o “grande profeta” deveria ser acolhido pela força de sua Palavra e presença, não tanto pelos sinais que a multidão busca. Jonas não fez nada de prodigioso e, no entanto, acreditaram nele, por isso os ninivitas aparecem como “grandes” diante de um Israel que viu, ouviu e sentiu a presença de Deus e não se converteu. Também nós não buscamos sinais para crer? Não buscamos certezas na nossa oração? A Palavra não nos basta? Onde está verdadeiramente a nossa confiança?




Pe. João Bosco Vieira Leite


Terça, 16 de fevereiro de 2016


(Is 55,10-11; Sl 33[34]; Mt 6,7-15) 
1ª Semana da Quaresma.

Nesse domingo Jesus nos falava da força que a Palavra de Deus na luta contra toda tentação. O profeta nos diz que a Palavra que sai da boca de Deus para ele não retorna sem cumprir a sua vontade. É nela que buscamos nos apoiar, porque acreditamos em sua eficácia.

Se há uma palavra de Deus dirigida a nós, há uma outra que nós dirigimos a Deus pela oração. Não queremos vencer a Deus pelo cansaço, como às vezes dá a entender certos textos, insiste-se na comunhão, não na quantidade de palavras. Por isso Jesus aponta os elementos que devem fazer parte da nossa oração: lembrar que Deus está em primeiro lugar na vontade a ser realizada, não tanto a minha. Santificar o nome de Deus é colocado em primeiro lugar. Lembra-lhe que temos necessidades a cada dia, e confiamos na sua providência, sem esquecermos dos nossos compromissos da vida de relação com o outro, pois a tentação de não sermos gratos a Sua presença em nossa vida pode nos fazer vítima do tentador, nos afastando da aliança estabelecida. O tentador tem medo de quem vive em contínuo espírito de comunhão e gratidão a Deus.


Pe. João Bosco Vieira Leite


Segunda, 15 de fevereiro de 2016


(Lv 19,1-2.11-18; Sl 18[19]; Mt 25,31-46) 
1ª Semana da Quaresma.

A santidade é o fim último de nossa caminhada de fé. Ser filho de Deus significa buscar imitá-lo, buscar Sua santidade. Assim a 1ª leitura propõe um itinerário de atitudes que nos aproxima dessa comunhão sempre maior com ele. Não são necessariamente atos de devoção, mas atitudes com relação ao próximo. A santidade aparece como uma proposta de caminhar na sua presença. A quaresma tem no seu programa espiritual a proposta de uma revisão de nossas relações com o outro.


O texto de evangelho complementa essa reflexão: seremos julgados a partir do que fizemos ou deixamos de fazer ao outro. Não podemos, na busca da comunhão com Deus, andarmos distraídos ou esquecidos dos que padecem nesse mundo necessidade de um olhar misericordioso ou justo no que compete as relações sociais.

Pe. João Bosco Vieira Leite

1º Domingo da Quaresma – Ano C


(Dt 26,4-10; Sl 90[91]; Rm 10,8-13; Lc 4,1-13).

1. Somos naturalmente atraídos em nossa atenção para o evangelho das tentações sofridas por Jesus, de alguma forma nos identificamos com elas. Mas a liturgia da Palavra amplia nossa visão nos dizendo que a força na tentação está também na nossa fidelidade a Deus, nosso reconhecimento, nossa profissão de fé.

2. Assim podemos acolher a 1ª leitura Ela trata do rito da apresentação das primícias no templo; um ato de agradecimento nas colheitas Àquele que criou as possibilidades. Nele, a apresentação das ofertas era acompanhada com uma profissão de fé, segundo prescreve Moisés. Esses frutos não incinerados no altar, mas distribuídos aos pobres de Israel: levitas, estrangeiros, órfãos e viúvas. 

3. Não basta professar a fé, ou tão somente celebrar os ritos. Nosso reconhecimento da generosidade divina se traduz na Sua providência para com os pobres da terra.

4. A quaresma, como preparação à Páscoa traz no seu centro a fé na ressurreição de Cristo. Paulo nos convida a reafirmá-la com a boca e com o coração. Aquilo que afirmamos com os lábios deve ter produzido em nós uma vida nova, deve estar nos ajudando a ser pessoas melhores. Paulo prioriza o combate a qualquer tipo de preconceito. Professar juntos a fé nos desafia nessa busca do reconhecimento de que Deus é Pai de todos e generoso para com aqueles que o reconhecem e o invocam.

5. As tentações sofridas por Jesus parecem um pouco longe de nossa órbita comum, mas na realidade querem apenas simbolizar toda espécie de tentação que faz parte do caminho de fé. A única diferença entre Jesus e nós é o fato de não ter se deixado vencer. O autor quer deixar claro que em sua vida mortal, assumindo a nossa natureza, viveu todas as nossas experiências.

6. A tentação de levar uma vida acima dos outros mortais, a ponto de usar seu poder para saciar as suas “fomes”, livrar-se das dificuldades, não encarnar tanto assim a nossa realidade. A prioridade de Jesus era usar o seu poder em benefício dos outros e não de si mesmo. Levou seu compromisso até a cruz, até as últimas consequências.

7. Nessa breve cena está a tentação do isolamento egoísta, “dos outros que se virem”, da nossa relação com os bens materiais, do acúmulo, da exploração, da busca do prazer tão somente. Quem à luz da Palavra de Deus contrapõe a própria vida, aprende o exato valor de cada coisa e as colocas em seu devido lugar, sem idolatrias.

8. Na 2ª cena o demônio afirma seu poder sobre todas as coisas, de fato; ele serpenteia por todas as realidades humanas. Seja o saber ou a riqueza material, nos avantajamos diante dos outros. A humilhação, o controle, a agressão, a intolerância etc. São formas de domínio que às vezes não nos damos conta e ainda podemos achar que estamos servindo a Deus, quando na realidade seguimos a lógica do diabo.

9. No mundo em que vivemos, é difícil não enredar-se por certa lógica esquecidos da lógica de Jesus, reinar é servir.

10. Na terceira cena joga-se com a imagem de Deus, constantemente manipulada e desmantelada. Será que Deus é tão bom assim como dizem? Que tal testá-lo? Essa cena tem ecos na caminhada de Israel no deserto e nos seus embates com Deus. Jesus sempre se recusou a exigir que Deus mostrasse o seu poder, apenas confiou, abandonou-se em suas mãos.

11. Seria possível também a nós acreditar nesse amor mesmo quando as coisas não vão tão bem como gostaríamos? No fundo, no fundo, não estamos a exigir provas de seu amor? Há os que pulam de galho em galho em sua vida religiosa como a procurar um Deus mais “forte”, esquecidos que Jesus é nosso modelo de vida e em nada, na sua humanidade foi poupado.

12. O diabo se afasta momentaneamente, para voltar no momento de Sua Paixão. Enquanto isso, olhando para o quadro das tentações de Jesus perguntamo-nos como anda as nossas relações com as coisas, com as pessoas e com Deus.


Pe. João Bosco Vieira Leite




Sábado, 13 de fevereiro de 2016


(Is 58,9-14; Sl 85[86]; Lc 5,27-32) 
Depois das Cinzas.
                                                                                                       
Bonito esse texto de Isaias que propõe, de maneira prática, atitudes renovadoras que faz o indivíduo acender dentro de si uma luz de possibilidades escondidas, enquanto ser humano, mas também de renovação da própria vida: “Quem tiver sede venha mim e beba, e do seio de quem crê em mim, hão de brotar torrentes de água viva, jorrando sempre sem jamais ter fim”. Reconstruir as ruinas, restaurar os caminhos, eis a proposta quaresmal apresentada nesse texto. Por fim, reconstruir as relações com Deus, conservando, em seu dia santo, a prioridade do tempo para Deus e para si mesmo.

Jesus manifesta o seu caráter misericordioso sentando-se à mesa com os pecadores. Veio para os que se sentem enfermos, necessitados de cuidados divinos. Essa profunda atitude de humildade diante de Deus faz com que Ele venha constantemente ao nosso encontro, convidando-nos a segui-lo. Quaresma é um caminho a ser percorrido com profunda consciência da necessidade de cura, libertação, restauração.

Catequese litúrgica: Se no advento temos a novena do Natal, na Quaresma temos a Campanha da Fraternidade que busca justamente promover a Quaresma e não o contrário. Praticamente, essa experiência começada em 1963, tornou-se um patrimônio da Igreja e da opinião pública de nosso país. A CF, apesar de há muito estar presente no tempo quaresmal, não fez ainda tudo o que lhe cabia. Arrancar o egoísmo do coração e das mentes, instaurar a corajosa e coerente civilização do amor fraterno, é tarefa difícil e longa, exigindo sucessivas e sempre intensas campanhas de educação e conversão. A CF busca evangelizar dentro do seu período de duração, animando as comunidades num compromisso pastoral concreto que marque a unidade da evangelização pelo empenho comum em prol da solidariedade e fraternidade que nascem do amor de Cristo. Este projeto atinge cada ano um problema determinado e urgente que necessita do esforço de ação pastoral conjunta no Brasil. De uma verdadeira motivação, de uma verdadeira pregação da fraternidade deve-se passar a uma consequente manifestação solidária de amor concreto (a coleta da Campanha ou outra iniciativa da comunidade). A CF tem por objetivo despertar o espírito comunitário e cristão do povo de Deus. Fazer com que cada pessoa chegue a ter sempre o mesmo jeito bom de ser diante dos outros e de Deus. Por isso, se ela é promovida durante um determinado tempo, seus frutos devem continuar durante o ano todo. Uma campanha de todos, para todos e com todos os meios.



Pe. João Bosco Vieira Leite

Sexta, 12 de fevereiro de 2016


(Is 58,1-9; Sl 50[51]; Mt 9,14-15) 
Depois das Cinzas.

O tema do jejum domina a liturgia da palavra, primeiro na voz do profeta que reclama de um jejum que não comporta uma preocupação com o outro, mas apenas o cumprimento de regras e o exercício externo da dor. Deus sente a partir de dentro, da dor de milhares de homens e mulheres que não podem ter uma vida mais plena. É necessário aprender a renunciar em favor do outro. Jesus fala da alegria de sua presença entre os discípulos e por isso não há necessidade de jejum entre eles; eles aprenderão do mestre a renúncia necessária e o momento de jejuar, seja pela ausência do “noivo” ou por exercício de desapego. O salmista nos diz que Deus prefere um coração contrito e humilde. Peçamos perdão, se nosso jejum não é um ato de misericórdia.

Catequese litúrgicaO tempo quaresmal é um tempo de sobriedade. Tempo em que exigimos mais de nós mesmos, usando maior vigilância evangélica, a fim de renovarmos a soberania de Deus sobre nós, unidos ao Cristo que vai ao encontro de sua Paixão. Cada um terá a sua maneira própria de viver este tempo, no que deve melhorar, no gesto concreto a realizar... Mas para todos o tempo quaresmal será de maior oração, de participação nas reuniões litúrgicas da comunidade ou nos encontros do grupo de famílias (Campanha da Fraternidade). E ainda é o tempo propício para uma confissão sincera. A Igreja não determina mais jejum e abstinência em toda a quaresma a não ser na quarta-feira de cinzas e a sexta-feira santa que sãos os dois dias de jejum e abstinência prescritos no Brasil. Mas isso não significa que o cristão não os observe voluntariamente. Por este gesto, reconhecemos a soberania de Deus sobre todas as coisas. Biblicamente, a mortificação do corpo visa a libertação do homem, que com frequência acaba presa das tendências dos instintos. Porém, a Igreja não se atém tanto neste aspecto do jejum e da abstinência. A Igreja insiste mais na penitência do amor fraterno na prática.



Pe. João Bosco Vieira Leite



Quinta, 11 de fevereiro de 2016


(Dt 30,15-20; Sl 01; Lc 9,22-25) 
Depois das cinzas.

A liturgia da palavra do tempo quaresmal é composta por textos diversos que em sua maioria tem um caráter penitencial. Alguns giram em torno de alguns temas específicos, como este de hoje: trata-se da escolha que o povo de Deus deve fazer antes de entrar na terra prometida; escolher a vida é escolher a Deus, no sentido que Ele é o autor e o protetor da vida. Não nos é permitido tirar ou atentar contra a vida, seja a nossa ou a dos outros. Cuidar da vida tem nuances diversas como nos propõe a Campanha da Fraternidade desse ano com relação ao planeta em que vivemos e as vidas que nele vivem que precisam ser cuidadas. Para completar a reflexão o salmo 01 nos afirma a felicidade de quem segue ao Deus da vida, comparando a uma árvore que na beira da torrente nunca secará. O tempo quaresmal nos propõe rever nossas escolhas.
E por falar em escolha, a palavra de Jesus a seus discípulos sobre a cruz do seguimento aponta para uma atitude de entrega da própria vida ao movimento da vida. Quem, em demasia, se guarda para si mesmo, se preserva dos envolvimentos da dinâmica do viver e conviver, vai perdê-la. A vida é um dom, e todo dom se enriquece a medida que desenvolvemos o que lhe é próprio: é próprio da vida dar-se, é próprio da vida servir. Peçamos ao Senhor a coragem de permitir que a nossa existência se enriqueça de sentido no seguimento a Jesus na descoberta contínua de sua vontade, como fez a Virgem a quem damos o título de Lurdes nesse dia.

Catequese litúrgica: A imposição das cinzas no início da quaresma tem sua origem na liturgia penitencial dos séculos III e IV, onde havia um caráter público do processo penitencial. A penitência pública é anterior à organização da quaresma. A quaresma foi vista como o tempo mais próprio para a comunidade dedicar sua oração e seus cuidados aos catecúmenos e penitentes. A imposição das cinzas como rito de entrada passou a vigorar no século IX e X, mas não era comum a toda a Igreja, somente no final da Idade Média (1453) o rito da imposição das cinzas passou a ser abertura da quaresma e um símbolo penitencial de arrependimento. O significado original da imposição das cinzas está na sua origem bíblica (Mt 11,21; Jo 3,6s): sinal de reconhecimento do pecado e da miséria humana diante de Deus. Mais tarde, a imposição das cinzas passou a ser sinal também da vida transitória de todos nós nesta terra. As cinzas impostas neste tempo costumam provir da queima das palmas e ramos do Domingo de Ramos que sobraram do ano anterior, e assim sempre estamos ligados ao mistério pascal. Esmagando nosso orgulho, vencendo nosso egoísmo, vivendo de maneira humilde, no despojamento e na pobreza, chegaremos à vitória da ressurreição. Construiremos em nós vida nova. A cor desse tempo quaresmal é o roxo.


Pe. João Bosco Vieira Leite


Quarta, 10 de fevereiro de 2016


(Jl 2,12-18; Sl 50[51]; 2Cor 5,20—6,2; Mt 6,1-6.16-18) 
Cinzas.

A Igreja nos convida a nos prepararmos para a celebração da Páscoa com um tempo de preparação que se chama Quaresma; na simbologia dos quarenta dias, se esconde o tempo bíblico de uma mudança significativa. Quaresma é tempo de conversão, de traçar um outro rumo, tomar nova direção. Isso não é simples. É preciso um tempo que nos permita amadurecer o desejo, rever as prioridades. Eis o tempo que a Igreja nos oferece. A liturgia da palavra começa com um convite de retornar ao Senhor feita pelo profeta, mas onde foi que nos distanciamos? A um povo que conhece os ritos penitenciais de uma época, ele convida à prática de exercícios que traduzam o nosso desejo de reparação, de retorno. Um apelo a misericórdia divina ecoa no salmo que segue à leitura. É a oração de Davi que se eleva na consciência do seu pecado. Paulo acentua, em outro tempo, que essa reconciliação com Deus pode se dar em Jesus Cristo. Veja que prova de amor Deus nos dá em seu Filho.  Ele vem para salvar. Feliz quem se deixa encontrar por Ele. Em Mateus recolhemos algumas indicações que como viver esse tempo penitencial: a prática da oração, não só em práticas externas ou comunitárias, mas na sinceridade do nosso coração e na presença do Senhor; o jejum e a abstinência nos ajuda a retomar o controle sobre si mesmo, o autodomínio que sempre precisamos sobre as paixões que advêm da existência e das relações; a esmola ou a caridade nos ajuda a perceber a necessidade do outro e a minha no desapego sobre as coisas que mais me dominam que me servem de fato. Tudo isso praticado na presença do Senhor. Só a Ele de fato interessa o nosso esforço de retomar a comunhão que perdemos. São apenas indicações para o caminho, outras coisas podem fazer parte desse itinerário. Talvez como o jovem rico, diremos: “tudo isso já tenho observado. Que me falta?” Talvez lhe falte uma convivência melhor com a palavra de Deus; um retorno ao sacramento da penitência; uma reconciliação pendente. Bom, você tem 40 dias para refletir e assim celebrar a Páscoa na certeza de que em Jesus, Deus faz nova todas as coisas. Uma boa caminhada quaresmal.


Pe. João Bosco Vieira Leite


Terça, 9 de fevereiro de 2016


(1Rs 8,22-23.27-30; 83[84]; Mc 7,1-13) 
5ª Semana do Tempo Comum.

Salomão, em sua oração, expressa seu desejo de sacramentalizar as relações do seu povo com Deus. O templo quer ser um sinal sensível da fé, um símbolo dessa Sua presença entre nós. Essa consciência de Salomão se desdobrará em seu zelo pelo lugar sagrado, na beleza que imprime ao local como expressão da própria beleza de Deus, cuja face não vemos, mas percebemos no mistério dos ritos, dos gestos e das pessoas, que de alguma forma Ele olha para nós.


O templo é a casa do louvor, mas é preciso que nossos lábios proclamem o que está em nosso coração, por isso Jesus adverte os fariseus e os mestres da lei para a sinceridade com que devemos estar na presença do Senhor. O Templo pode burocratizar as nossas relações com Deus e fazer perder a espontaneidade e a sinceridade. Esvaziamos não só a Palavra de Deus, mas o próprio culto quando nossa atitude de escuta não nos leva a atitudes mais sinceras a partir do que intuímos em nosso coração. Para Jesus a dinâmica do amor é sempre criativa quando iluminada pela palavra de que Ele mesmo nos dirige.


Pe. João Bosco Vieira Leite

Segunda, 8 de fevereiro de 2016


(1Rs 8,1-7.9-13; Sl 131[132]; Mc 6,53-56) 
5ª Semana Comum.

A transferência da Arca da Aliança de sua antiga tenda para a nova morada é marcada com toda solenidade possível. Na arca estão apenas as duas tábuas da lei, parece pouco para um Deus tão grande, mas a observação deste pouco significa viver na presença de Deus, que enche com sua glória os espaços que permitimos a Ele habitar. Há algum espaço em sua vida que não foi inundado por Sua presença?


É dessa presença misericordiosa de Deus que vem ao nosso encontro em Jesus que nos fala o evangelho. Muitos vão até ele com seus enfermos e com suas enfermidades. Querem tocar n’Ele. Querem ficar curados, mas precisam ser tocados por Ele para que não permaneçam na superficialidade de quem tem que voltar continuamente à fonte para matar a sua sede. Jesus nos diz que quem dele verdadeiramente beber não sentirá mais sede. Deixar que a força do Espírito toque verdadeiramente o nosso coração, despertando em nossa consciência a confiança e a certeza de que Ele sempre caminha conosco, está dentro de nós, independentemente de qualquer travessia que façamos nessa vida. Você já foi “tocado” por essa certeza em sua vida de fé?


Pe. João Bosco Vieira Leite

5º Domingo do Tempo Comum – Ano C


(Is 1-2a.3-8; 137[138]; 1Cor 15,1-11; Lc 5,1-11)

1. Em linhas gerais podemos perceber um cunho vocacional nas leituras de hoje. Da experiência de chamado de alguns podemos perceber e compreender a experiência de chamado divino também em nossa vida. Algumas experiências são intraduzíveis em palavras e necessitam de imagens que traduzam o que queremos expressar. É assim que podemos acolher esse texto de Isaias.

2. Ele nos conta sobre sua vocação; sobre aquilo que interiormente se passava consigo; intui que o Senhor o chama, mas sabe das suas próprias limitações e pecados. Ele entende que Aquele que chama não só torna apto o instrumento, mas purifica, poda os galhos, para que dê mais frutos, utilizando uma imagem do evangelho.

3. Mergulhados na convivência comum e comparando-nos aos outros, podemos até perceber que não somos tão maus assim, mas o contato íntimo com Deus e sua Palavra nos leva a reavaliar o auto conceito. Mas isso não nos torna indignos de estar na Sua presença, de não aceitar participar de modo mais ativo de seu projeto, ao contrário, nos faz sempre mais perceber que a ação é do próprio Deus.

4. Nossa leitura da carta de Paulo deu um pequeno salto e nos encontramos com o testemunho do Apóstolo sobre a credibilidade do que ele prega e sobre seu chamado. Paulo compreende-se quase como desnecessário à obra de Deus, mas pelo Seu querer, por Sua graça ele se tornou quem é nesse momento da caminhada de evangelização.

5. Paulo reafirma o poder da graça divina de transformar nossas vidas e tornar-nos aptos ao seu chamado; sem vaidades, entregando-se confiante e deixando-se moldar pela sua Palavra.

6. O projeto que Jesus apresentou na sinagoga em Nazaré não se faria de modo mágico, mas participativo. Para nos dizer isso Lucas nos narra o chamado dos primeiros discípulos. São pescadores que acabam de chegar. Pede-lhes para utilizar a barca como púlpito. Ouvem sua palavra; para convencê-los ainda mais, leva-os a experiência do improvável: uma pesca inesperada.

7. A palavra soma-se a um evento e os convence de estar diante de alguém maior que eles, talvez um santo de Deus. Jesus os acalma e os convence a vir com Ele para uma outra pescaria. O seu projeto de vida e liberdade necessitaria do comprometimento de alguns, ainda que limitados e pecadores.

8. Que experiência de fé nos trouxe aqui? O que nos leva a continuar pescando, mesmo quando não há sinais de peixes? Compreendemos que somos todos chamados a colaborar nesse projeto de Jesus? Compreendo que meus pecados não são impedimentos e que minhas limitações sempre poderão contar com a graça de Deus? Tenho confiado em seu chamado? Tenho implorado por misericórdia?

 Pe. João Bosco Vieira Leite 

Sábado, 06 de fevereiro de 2016


(1Rs 3,4-13; Sl 118[119]; Mc 6,30-34) 
São Paulo Miki e companheiros mártires.

Certamente já ouvimos a frase: “cuidado o que você pede em oração!”. Salomão vai rezar ao Senhor e reconhece a sua grande missão e pequena condição, já que sucederá o grande Davi. Ele pede a sabedoria necessária. Deus vê o seu coração e lhe concede muito mais do que pediu. Penso que a atitude de humildade foi fundamental para Deus operar com abundância no coração do novo rei, como operou na vida do fariseu que vai ao templo fazer sua oração e nem pensa em levantar a cabeça diante de Deus. Nesse dia em que recordamos a Virgem Maria, lembremos o seu coração humilde, dócil, compreensivo. Peçamos a ela que interceda ao Filho para que também tenhamos um coração dócil e humilde, que saiba acolher as moções do Espírito, pois sozinhos, com nossas forças, não somos capazes de descobrir e realizar a vontade de Deus.

Os discípulos retornam da sua excursão missionária; Jesus os chama a descansar com Ele e nele. Mas as multidões os seguem e Jesus se vê impossibilitado de dar o devido descanso aos seus discípulos. Mesmo assim não deixa de oferecer-lhes uma indicação pastoral: a compaixão deve nos fazer discernir o exato momento de deixar o descanso para socorrer o outro. Talvez nem sempre o façamos de bom grado, mas o Senhor nos convida a sermos solidários com a dor alheia, a fim de sermos seus discípulos.  Como  Maria a Isabel.

Pe. João Bosco Vieira Leite



Sexta, 05 de fevereiro de 2016


(Eclo 47,2-13; Sl 17[18]Mc 6,14-29) 
Santa Águeda.

Talvez o texto do Eclesiástico ficasse muito bem num discurso fúnebre exaltando as qualidades de Davi sem deixar que reconhecer os seus pecados. Sobressai o guerreiro e o homem piedoso: coragem e piedade. Força e ternura. Não é atoa que o próprio Davi é uma figura de Cristo, em suas qualidades.

Marcos narra para nós o episódio que culminou na morte de João Batista, quando Herodes “perde a cabeça” e faz uma promessa atrapalhada. O texto deixa claro que seu ato inconsequente nunca lhe saiu da consciência.  A quem diga nunca se arrepender do que faz. Não reconhecer os próprios erros já é uma estupidez. Como anda a sua vida? Nesse ano da misericórdia, somos convocados a aliviar os fardos que carregamos e ao mesmo tempo ouvir os apelos de Jesus que nos convidam a viver de modo novo, diferente.

Pe. João Bosco Vieira Leite


Quinta, 04 de fevereiro de 2016


(1Rs 2,1-4.10-12; Sl 1Cr 29; Mc 6,7-13) 
4ª Semana do Tempo Comum.

A liturgia nos traz essa transição entre o reinado de Davi e de Salomão. O texto tem um cunho testamentário, não no sentido material do que se deixa, mas dos conselhos essenciais para que ele permaneça na presença do Senhor e observe seus mandamentos como condição para a perpetuação da linhagem davídica. Davi reconhece, na morte, o caminho comum, mesmo para um rei de seu porte; suas palavras podem ser tomadas também por nós como uma busca do essencial no caminho da fé. Mas tal observância é impossível sem uma busca maior de conhecer ao Senhor.

O envio dos doze por parte de Jesus é acompanhado por uma série de recomendações, primeiro no sentido do que não devem levar ou fazer para que não lhes falte o essencial: a confiança em Deus. Essa exagerada preocupação de Jesus diz respeito ao testemunho a ser dado, pois o desapego ou despojamento é o primeiro sinal da confiança. Assim a palavra atinge seus discípulos de todos os tempos: quais são as nossas preocupações? A nossa oração depende também de nossa confiança e da liberdade em que se encontra o nosso coração.


Pe. João Bosco Vieira Leite